Trauma é uma definição ampla usada para descrever lesões causadas por uma força externa devido a acidentes, violência ou auto-agressão. É categorizado por mecanismos de lesão que incluem: trauma penetrante, trauma contuso ou sua combinação.
A palavra “trauma” é mais comumente usada para descrever uma lesão corporal que é grave, súbita e inesperada. As causas mais comuns de traumas maiores são: acidentes veiculares, atropelamentos, ferimentos por arma de fogo, ferimentos por arma branca, quedas de altura, queimaduras, afogamentos e agressão interpessoal.
A DOENÇA TRAUMA
Cinco pontos-chave ajudam a entender a relevância dessa doença:
- O trauma é a causa mais comum de morte em pessoas com menos de 40 anos e sua incidência deve aumentar nos próximos 20 anos;
- É a doença que mais consome recursos médico-hospitalares em todo o mundo;
- Constitui a principal causa de morte e incapacidade em ambientes civis e militares;
- As guerras são fonte de mudanças consideráveis no atendimento de vítimas de trauma e no desenvolvimento de centros especializados;
- Treinamento específico é condição indispensável para profissionais de saúde trabalharem com vítimas de trauma, pois é necessário conhecer as particularidades da doença.
MECANISMOS DE LESÃO NO TRAUMA
Os mecanismos geradores de lesões graves no contexto militar são as explosões, seguidas por ferimentos por arma de fogo e por colisões de trânsito. Isso contrasta com o ambiente civil onde predominam as colisões de trânsito e os atropelamentos, embora sejam crescentes os percentuais de agressão interpessoal.
ASPECTOS DIFERENCIADOS DOS CUIDADOS EM AMBIENTE MILITAR
Cuidar de vítimas de trauma em ambiente militar é sempre desafiador devido ao ambiente hostil e os obstáculos naturais. A logística costuma ser escassa e as instalações médicas, provisões e equipamentos podem estar a muitas milhas de distância necessitando ser trazidos por aeronaves ou outros recursos disponíveis. O abastecimento de recursos vitais como alimentos, água e eletricidade pode estar comprometido em um ambiente difícil de controlar; isso inclui a gestão de resíduos hospitalares e de corpos sem vida.
TREINAMENTO PARA ASSISTÊNCIA AO TRAUMA
Uma variedade de treinamentos em trauma está disponível, incluindo programas como o Advanced Trauma Life Support (ATLS). A maioria é liderado por médicos e se concentram mais no atendimento pré-hospitalar e no departamento de emergência. Programas mais específicos para enfermeiros são menos comuns, mas também costumam estar disponíveis como é o caso do Advanced Trauma Care for Nurses (ATCN) que, realizado juntamente com o ATLS, promove a interação entre os membros da equipe de saúde e os prepara para os diferentes padrões de lesões e de configurações clínicas dos serviços de trauma.
TREINAMENTO PARA AMBIENTES MILITARES
Treinamento de trauma militar em ambiente pré-hospitalar de um campo de batalha é essencial para aqueles que trabalham no front. Quem trabalha em hospitais de campo deve participar de treinamento específico através de grandes simulações e de cursos específicos como o treinamento cirúrgico para equipes de saúde.
O treinamento em grande escala, baseado em simulação, deve ser direcionado a habilidades clínicas que incluem consciência situacional, tomada de decisão, comunicação, trabalho em equipe e liderança, além de habilidades ambientais e de cuidado clínico. Embora esse modelo seja bastante efetivo para a aquisição de habilidades, o treinamento não termina quando o aluno obtém o resultado desejado, pois as competências trabalhadas devem ser demonstradas de forma contínua, no cenário correto.
Um estudo concluiu que os enfermeiros do exército americano precisavam de treinamento adicional usando padrões nacionais e experiência prática. O modelo indicado foi o programa do ATCN acoplado ao curso ATLS e a avaliação de competência foi sumarizada pela obtenção da respectiva certificação.
Em outro caso, o treinamento em serviço de cirurgiões, enfermeiros, técnicos de emergência médica e técnicos de sala de cirurgia do exército dos EUA, em um centro de trauma de nível um por 30 dias, deu a todos maior experiência do que possuíam em sua estação de origem.
A vantagem dos cursos internacionais é o fato de fornecerem uma abordagem padronizada, estruturada para o trauma, o que resulta em uma “linguagem comum” aos praticantes.
A Organização Mundial da Saúde afirma que os profissionais de todos os níveis devem ter as habilidades necessárias para lidar com o trauma, incentivando sua participação em cursos de qualificação. Entretanto, apenas participar desses programas não garante a competência, pois a retenção da informação e da habilidade tende a se perder após a conclusão do curso, sendo necessário um processo de formação prática contínua para que seja eficaz.
CENTROS DE TRAUMA
Nas últimas décadas, no mundo inteiro, a criação de Centros de Trauma melhorou a sobrevida das vítimas de trauma grave e isso se deve, principalmente, a evolução do atendimento pré-hospitalar, a maior qualificação profissional exigida nesses centros e o desenvolvimento de uma cultura própria relativa à doença trauma e ao processo de treinamento nessa área.
Causas de Trauma e Tipos de Trauma
Os acidentes veiculares e atropelamentos incluem toda a sorte de veículos que trafegam na via pública e incluem motocicletas, bicicletas, patinetes e outros. Durante muitas décadas esse tipo de lesão era preponderante. Os atropelamentos, diferentemente de outras lesões, acometem a faixa mais idosa da população. Isso se deve as limitações funcionais de locomoção, audição e visão próprias dos idosos.
Estes eventos estão relacionados com o tipo de trauma contuso, aquele onde o instrumento que atinge a vítima é contundente: soco, pau, pedra e etc.). Nesses casos as lesões podem ser desde uma simples vermelhidão, inchaço, equimose, hematoma ou escoriação até uma ferida de bordas caracteristicamente irregulares.
Após o advento do cinto de segurança, que evita o impacto contra os vidros estilhaçados, as lesões decorrentes de acidentes veiculares são essencialmente contusas e se desenvolvem pelo impacto do passageiro contra o interior do veículo. Na ausência do uso dos mecanismos de proteção poderá haver lesões cortantes ou cortocontusas, por ação do vidro estilhaçado.
Os ferimentos por arma de fogo e arma branca estão associados à violência urbana, onde roubos, assaltos, homicídios e a constante beligerância entre gangs rivais constituem sua principal origem. Após os anos 80 houve um crescimento exponencial destas ocorrências que hoje, em termos de mortalidade, se equiparam aos ditos “acidentes de trânsito”.
Os projetis de arma de fogo usuais (revolver, pistola) determinam um orifício de entrada que é arredondado e com bordos voltados para dentro. Se houver orifício de saída ele terá formato mais irregular e maior e os bordos estarão evertidos. Outras armas de fogo podem produzir lesões diversas e mais complexas do que as acima descritas.
Quando a lesão é produzida pela lâmina da faca, decorre de sua ação uma ferida de bordos regulares com profundidade variável, mais superficial nas extremidades (caudas), este é um ferimento cortante. A profundidade está relacionada a força emprega para o golpe e o fio da arma. Se a ação se der pela ponta da faca ele vai ocasionar uma ferida mais profunda do que larga denominada perfurocortante.
Convém lembrar que se ação decorrer do uso do cabo da faca ou da coronha do revólver a lesão produzida terá características de lesão contusa.
As quedas de altura, especialmente quando superam duas vezes a altura do indivíduo, costumam ocorrer com mais frequência em construções, como acidente de trabalho, mas também como tentativa de suicídio a partir de locais elevados. Essas lesões costumam causar danos as partes ósseas que primeiro se chocam contra o solo, bem como ruptura dos órgãos internos por mecanismo de desaceleração súbita. Os resultados dependem da altura, da posição de chegada ao solo e da idade e compleição do indivíduo.
As queimaduras também podem ter origem em acidentes de trabalho que envolvem armazenamento de combustível, uso de substâncias cáusticas (ácidos) fogos de artifício, uso doméstico de álcool, explosões e acidentes que envolvam fogo e chamas. Os ferimentos variam desde vermelhidão produzida pelo calor (primeiro grau), formação de bolhas de conteúdo seroso (segundo grau) até a destruição de tecidos mais profundos (terceiro grau). A extensão da área acometida e de lesões de terceiro grau são fatores que determinam a sobrevida do paciente.
No período do verão, ou em áreas constantemente quentes e com águas balneáveis, o afogamento se constitui numa frequente causa de morte devido a correntes inesperadas, cãibras, mal súbito e, mais frequentemente, despreparo e ousadia do nadador em local sem salva-vidas.
A agressão interpessoal sem uso de armas excepcionalmente leva a morte, mas se trata de evento comum e que pode causar danos inestimáveis. Assim como no caso das armas de fogo e brancas, geralmente está associada ao uso de álcool e drogas.
RECOMENDAÇÕES PARA O PREPARO À ASSISTÊNCIA AO TRAUMA
- Participar de cursos e eventos teóricos e práticos a fim de manter-se atualizado e aprimorar habilidades é a melhor forma de manter-se qualificado;
- A retenção de competências está intimamente ligada à prática, ao estabelecimento e atualização periódica de rotinas;
- Os treinamentos devem possuir algum critério de eficiência e serem responsivos aos padrões de lesões e ao ambiente clínico relacionado a sua realidade;
- Demonstração de habilidade ou frequência a um curso não equivale a competência e precisa ser consolidada com experiências práticas e reflexão e apoiada com competências;
- O treinamento interdisciplinar, em equipes e com especialidades cruzadas, deve estar incluído entre os processos de formação que preparam para o atendimento.
CONCLUSÕES
- A base de evidências em cuidados de trauma militar e civil tem evoluído bastante últimos anos, contribuindo para a formação de profissionais de todos os níveis e para a constante renovação de habilidades.
- A qualificação profissional, o treinamento em serviço, a contínua preocupação em manter-se atualizado e a manutenção de um elevado interesse e no exercício prático das atividades, são características indispensáveis para obter êxito na recuperação de vítimas de trauma.
- Estabelecer um trabalho centrado no desenvolvimento de competências próprias para o ambiente de trauma e para as características locais e universais deste modelo de assistência pode ajudar na aplicação de protocolos e otimizar os custos demandados.
TCBC, FACS, PhD
Átila Velho – Cirurgião, Coordenador do Programa ATLS-RS, Sócio Fundador do CETS